terça-feira, 26 de novembro de 2013

Rainer Maria Rilke

"Vivemos tão mal porque chegamos sempre inacabados ao presente, incapazes e dispersos em tudo"

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"O tempo não é uma medida. Um ano não conta, dez anos não representam nada. Ser artista não significa contar, é crescer como a árvore que não apressa a sua seiva e resiste, serena, aos grandes ventos da primavera, sem temer que o verão possa não vir. O verão há de vir. Mas só vem para aqueles que sabem esperar, tão sossegados como se tivessem na frente a eternidade"

- Rainer Maria Rilke
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Pensamentos desgostosos sobre o tempo rondam minhas atenções nesta noite. Vivo uma ardente inquietação por não ser capaz de me adequar à pulsação frenética das horas, que passam como uma ventania imprudente e precipitada...

© Natacha Cortêz

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Burburinhos do pensamento

Receber a notícia de que alguém morreu me sensibiliza muito para a vida. Eu, que tanto amo meus dias e sonhos reais, me dou conta de que sou efêmera. Como um dente-de-leão que, pego desprevenido pelo mais leve sopro, desconstitui-se por inteiro. Mas tão lindos são os dentes-de-leão...

E só de imaginar que a morte pode significar um voo intenso em direção à liberdade, o coração aquieta. E, iminentemente, eu prometo: minha alforria vai acontecer em vida.


sábado, 19 de outubro de 2013

Carona no vento para o horizonte

Encostar no parapeito da janela da varanda é um êxtase. Não porque as águas do mar estão alegres e dançantes quebrando umas sobre as outras, mas porque o vento que as move parece bater em minha janela pedindo para entrar. Indubitavelmente, abro. E ele me abraça: salgado por natureza, doce por elucidação poética.

A brisa do mar cheira à liberdade. E eu me deixo levar. Sinto o corpo desconstituindo. E como pequenas partículas livres e sem rumo diante de um sopro forte, vou cambalhotando brisa afora.

É que eu sempre tive vontade de tocar o horizonte. E, disfarçada de ser humano, como ando ficando com certa frequência, estava impossível. Descobri que para alcançar horizontes era preciso estar despido: de roupas, preceitos, pré-conceitos, sangue nas veias. Por que somente os humanos possuem sangue nas veias. E no horizonte é preciso deixar tudo isso para trás.

No lugar do sangue, sonho. No lugar de ser humano, apenas o verbo ser.



segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Arrebatamentos

A pequenez do pássaro
diante do mar

E nossa pequenez
diante dos pássaros

Tão grandes somos
em alturas e larguras

E quão incapazes
de voar

O pássaro entende
dos ventos que movem o mar

E nós
O que entendemos
Da liberdade dos pássaros?

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Despertencimento


Os cômodos tomados por ruídos da TV, interruptores sensíveis ao movimento, lâmpadas de LED e cafeteira expressa. Meu corpo parecia tão morto para uma casa tão viva. Ou era a própria quase-autonomia daquilo tudo que me matava? Ter o movimento do dedo indicador era o que bastava para ebulir as engrenagens daquele mundo. Na verdade, os dedos eram as próprias engrenagens.

O coração, já raquítico, embargava. A carcaça, contudo, permanecia firme e fixa ao chão, à exemplo dos manequins dos shoppings centers. Mas, dentro de mim, eu minguava. Moída como grão de café, dissipada por mim mesma feito fumaça do líquido quente e infectado de tecnologia.

Aos poucos, eu despertencia. A essência escorria por entranhas e mucosas e ali ficava, aos pés do manequim, suplicando para voltar a constituir-se corpo.

Ouvi batidas na porta. Permaneci imóvel. Entraram. Sabia que entrariam. Era de praxe o não interesse em buscar saber sobre as vontades de quem se encontra do outro lado do território. "Porta", para eles, significava apenas um pedaço morto de madeira. Uma intransigência no meio do caminho.

Tornava-se inútil dizer que por trás da porta, às vezes, está o doce caminho para a solidão. E que o barulho do silêncio é música para os que gostam de ficar do outro lado daquele pedaço de matéria insossa.
A carcaça foi cumprimentada. Os lábios esticados como que por um repuxo violento. Os dentes aparentes, mas amarelos. Através uma felicidade petrificada, eu até parecia sorrir.

Fui perguntada sobre os trabalhos, sobre os estudos, sobre dinheiro. Eles eram meus pais. Mamãe deu-me um beijo. Os lábios quentes não perceberam a frieza de minhas bochechas. O abraço de meu pai não foi capaz de notar o barulho oco vindo de dentro de mim. Às vezes desconfiava, mesmo, da capacidade dele de discernir entre uma veia que pulsa e um fio de cafeteira elétrica.

Eles deram-se as mãos e no primeiro passo adiante estatelaram-se no chão. A essência viscosa debaixo de seus sapatos denunciava o motivo do desequilíbrio. Parte minha, tão líquida e tão livre, agora banhava a sola de dois pares de calçados. Carregando o peso de um parelho de corpos nas costas, lutando para não fadigar. Tentando, a cada oportunidade, desgrudar-se das solas. Unir-se à essência-mãe, como pedaço remanescente, para desvelar-se corpo. Fora dali. Para, enfim, pertencer-me.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Não existe hora certa pra nada. Esperar o dia certo para escrever, a pessoa certa para se apaixonar, aquele emprego que pode salvar todas as suas frustrações econômicas. A gente idealiza a vida de um jeito irresistível. Mas depois descobrimos que o irresistível mesmo é opor-se a ela. E ao tomar essa coragem, embarcamos em expedição sem volta. Aceitamos viver em alto mar, podendo respirar brisa fresca ou sermos engolidos pela maré.
Ficar acordada para sempre. Essa é a vontade que tenho, na maioria das vezes, durante o caminho que faço de casa para o trabalho.

A bênção de poder enxergar. O que seria de mim sem meu perfeito globo ocular abraçando o rosto? Junto dele, meus óculos. Óculos e ósculos. Meus óculos me permitem oscular.

E eu beijo. Beijo cada cena como se fosse um enorme sorvete. E meu corpo fica doce.

Circundar o mundo todo com os braços meus. Engolir os mares, areias, conchas. Chamar tudo de meu. E é, não é? É meu e seu. É de nós. E de todo mundo que se permite sentir.


terça-feira, 6 de agosto de 2013

Indócil reflexo


Diz pra mim
Que o nada não te atrai
Mas não consigo crer

Como não aguça tua curiosidade
Pensar que no nada das águas
nadam tudo?

Não achas violento que
mal coloca-se a cabeça
entre as frestas de um deque
para espiar a vida simples
na superfície da água escondida
e o lago já te rouba a face inteira?

Não te incomodas pensar
que toda vez que fores baixar
na beira de uma bacia d'água
terá que oferecer outrora
toda a sua fronte?

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Fragilidade

Há quem diga que só a felicidade é digna de registros. Cabelos esvoaçantes, sorrisos, violetas na janela. Mas eu... Confesso que gosto de registrar tristezas. Não é porque me agrada a sensação das lágrimas escorrendo pelos olhos, mas porque me acalma a ideia de que as palavras podem conduzir, de alguma maneira, o furacão instalado dentro de mim. E digo conduzir porque "diminuir" não seria a palavra correta. Faço questão de que a ventania forte que sacode a vida e tira tudo do lugar tenha lugar permanente por aqui. Não saberia viver de outra forma. Preciso doce e amargamente do eterno turbilhonar...

terça-feira, 2 de julho de 2013

Carta à mãe

No submundo de meu cafofo cultivo idéias humanas.
Demasiadamente humanas, que absurdamente te ressoariam, mãe.
E eu espero que um dia a música deste sentimento te invada, e você possa sentir seu coroação batendo não mais dentro de ti, mas fora.
Como toda a emoção que se preze, que bate forte demais para caber no peito. Pois peito que é peito, mãe, é rasgado no meio e escorre.....

Livre

Abstraia
Traia 
O manual
Dos bons costumes
Que de bom
Nada possuem

Improvise
Viva
Nunca, nunca generalize
Pois quem generaliza
.....
Quem generaliza
Definha